As terras do cerrado que permanecem ociosas durante o período da estiagem já podem ser utilizadas para engordar o gado. Com o sistema Santa Fé, descoberto por acaso, o plantio do capim é feito integrado com a lavoura anual e, após a colheita, fica a pastagem
Texto Verena Glass Fotos Ernesto de Souza
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Feliz acaso
O sistema foi desenvolvido a partir de um desses felizes acasos que muitas vezes precedem as grandes descobertas. Criador de boi e produtor de grãos, o engenheiro Ricardo Merola, dono da Fazenda Santa Fé, no município de Santa Helena de Goiás, GO, há cerca de três anos se viu às voltas com uma infestação de mofo branco, praga que estava ameaçando a sua produção de feijão irrigado. A conselho de João K., antecedendo a leguminosa, Merola plantou milho em consórcio com braquiária, com o propósito de produzir uma boa palhada para a proteção do solo, e, principalmente, aproveitar as propriedades alelopáticas do capim, capazes de inibir fungos de solo como o próprio mofo branco, a rhizothonia e o fuzarium (embora não comprovado cientificamente, o poder alelopático da braquiária tem sido constatado na prática). Como o objetivo era combater a praga, a provável perda da safra de milho não teria importância. Mas, para surpresa geral, ela não sofreu nenhuma alteração, ao mesmo tempo que o capim se desenvolveu vigorosamente. Dessecada para receber o plantio do feijão, a braquiária formou uma grossa camada de palhada, o que, além de solucionar o problema do mofo branco, aumentou consideravelmente a qualidade do grão colhido, limpo de torrões de terra e outras impurezas.
Revolução
Com essa primeira experiência de consórcio, os pesquisadores chegaram a várias conclusões: em primeiro lugar, a braquiária não concorre com o milho; aproveita, sim, parte da adubação destinada ao grão, consumindo o que não é assimilado pela cultura. Por conta de seus poderes alelopáticos e do grande volume de massa verde, que constitui uma barreira física sobre o solo, não só inibe os fungos, como também o crescimento de mato. Destinado à cobertura de solo, forma uma palhada espessa e de lenta degradação, protegendo a área e liberando gradativamente os nutrientes contidos na massa seca. E, se a área não for irrigada nem aproveitada para o plantio de uma segunda cultura, está pronta uma pastagem de excelente qualidade. Enquanto forragem para a alimentação do gado, a única diferença desse capim para o da estação chuvosa, explica João K., é que a produção de massa verde no inverno é um pouco menor, proporcionalmente à queda da temperatura de cada região. A partir desses resultados, João K. e sua equipe, que nos anos 80 desenvolveram o sistema Barreirão (ver Globo Rural nº. 76 fevereiro/92), deram mais um passo no que o pesquisador considera uma revolução no ciclo produtivo do cerrado: a integração lavoura/pecuária. Batizado de Santa Fé em homenagem à fazenda onde nasceu, o novo sistema permite várias formas de aplicação. O agropecuarista que engorda parte do gado em confinamento durante o inverno, como é o caso de Merola, pode colher milho para silagem em dezembro, deixar que a braquiária se desenvolva e fazer três cortes de capim de 45 em 45 dias, também para silagem. Quem prefere a criação de gado a campo colhe o milho para grão em fevereiro e solta o gado nas pastagens de braquiária, que se mantém verde e nutritiva durante todo o período do inverno no primeiro ano. Por fim, o produtor desseca o resto de capim e entra com uma cultura no sistema de plantio direto no início da safra seguinte.
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